Neste início de milênio, vivenciamos profunda crise em inúmeros setores. Apesar da globalização, grande parte das pessoas mergulha no isolamento e na miséria, a informação circula fragmentada e superficial, destrói-se irresponsavelmente o planeta. Na falta de parâmetros éticos e de crenças, essa parcela da humanidade afasta-se de si mesma, do outro, da natureza, do cosmo, de Deus.
Limitado a um tipo de conhecimento racional, tecnicista, altamente especializado, o homem, em sua maioria, desligou-se do conhecimento mágico e religioso dos ancestrais, que o integrava num todo harmonioso. Vive preso a valores materiais. Administra o presente, desmemoriado do passado e descomprometido com o futuro. Caleidoscópio incolor, acumula estilhaços: corpo/mente/alma; razão/emoção/intuição…
O apocalipse, porém, não se anuncia. Fritjof Capra, em O ponto de mutação, identificou uma nova visão da realidade, emergente das cinzas desse desastroso processo de civilização. Apoiado em conceitos da ciência contemporânea, apontou para uma mudança de paradigma, semelhante à concepção de mundo de filósofos e místicos orientais antigos.
O ser humano necessitará recuperar alguns conceitos do taoísmo, do budismo, dos tratados de alquimia – o sentido de totalidade expresso pelo Tao; as ideias de movimento e de mudança permanentes; a percepção da convivência dialética dos opostos; o sentimento de desapego às coisas; a noção de energia vital, irmanadora de todos os seres…
Essa (re)visão holística do universo, a (re)unir ciência, arte e religião, pontua as canções de Gilberto Gil. Filosofia e misticismo orientais, xamanismo, religiões afro-brasileiras dão as mãos à teoria quântica. Posturas yin e yang, modernidade e ancestralidade abraçam-se em muitas de suas letras e músicas.
O que se anunciava como tendência em Deus mudança, Tempo rei, Copo vazio, Se eu quiser falar com Deus explode em alusões explícitas em Quanta, Estrela, Dança de Shiva, Água benta, Pop Wu Wei…
Gil, profeta de uma globalização mais espiritual e autêntica, entoa acordes de uma nova era: “O nome de Deus pode ser Oxalá, Jeová, Tupã, Jesus, Maomé e tantos mais / Sons diferentes, sim, para sonhos iguais“.