Sonhos
É sempre o mesmo pesadelo antigo,
devasta o lençol da cama, assusta e faz estragos,
um bombardeio no peito.
Ando na rua sem blusa.
Os sérios disfarçam e forçam um não reparo,
mas com olho comprido me devassam.
Mocinha, costumava andar corcunda
pra ninguém notar os peitinhos espetando na camisa.
Minhas irmãs sempre foram mais velhas e sabidas,
conheciam segredos e risinhos,
tinham tesouros escondidos nas gavetas.
É sempre um fogaréu ardendo sobre a gola.
Se a bolsa cai, os intestinos pulam fora:
o batom, algumas moedas, um absorvente,
a caixinha de lentes de contacto, um lápis, gravetos, pedrinhas,
o pó compacto, a carteira de identidade oh! o espelhinho quebrado!
É sempre um medo velho e uma vontade
de ser agarrada pelo homem guloso
que irrompe na esquina. Um chiste pornográfico,
o susto, o coração fugindo em disparada,
o passo aperta e fica atrás um homem e seu mistério,
o raio-x descobre o que antes era saia.
É sempre e sempre o desejo primevo
de tirar a veste dos senhores e senhoras.
Parar o tempo no ar ou brincar de estátua.
Cada um ficasse no meio do gesto, um jeito, um passo,
pelos, aragem, arrepios, mormaço, sereno,
pênis em descanso, pênis em relevo,
leite escorrendo de seios, vermelho pintando entre coxas,
cabelos dourados, peles negras, púbis morenos,
vidas pulsando despidas de panos e de pânicos,
florestas de pessoas desfolhadas de parreiras e pecados,
mulheres parindo crianças sem segredos, medos, pesadelos…